"Sofremos com essa ideia de cidade do carnaval, com o papo de que aqui o negócio é samba e chorinho... Não aguento ouvir que a Lapa é do samba. Lá tem o Circo Voador!" As palavras acima são do Bacalhau, baterista da banda Autoramas, e foram publicadas na edição digital d’
O Globo (4/01/2010) quando da divulgação do DVD/CD
Autoramas Desplugado. Além disso, segundo o jornal, o baterista “arrisca um misto de falta de interesse de público, de casas adequadas e de uma política pública voltada para o rock”.
Concordo em parte com o Bacalhau, a Lapa e o Rio já foram mais rock, mas também já foram mais reggae, mais samba, mais chorinho, mais MPB, mais lambada... a lista pode ir ao infinito se pensarmos em todos os modismos que já imperaram por aqui. E, segundo me consta, a Lapa é um dos berços do samba no Brasil, e este gênero merece seu lugar reservado em qualquer recanto que tenha uma aparelhagem de som e pretenda tocar... samba. No entanto, fiz umas perguntas para o Celão, grande alvinegro e baterista dos Inimigos do Rei, que mandou uma boa resposta sobre modismos e mercado “... o mercado fonográfico (que não existe mais, e ninguém sabe o que vai acontecer) fazia o marketing de cada verão um estilo!”. Acredito que isso também é verdade. O modismo mais recente é o samba! E já dura alguns verões. Por favor, sem preconceitos e hipocrisias, minha intenção não é ofender ninguém, simplesmente acho isso. Acredito que a falta de interesse por parte do público é devido ao modismo. Mas a Lapa, conforme todos gostam de alardear, é eclética e democrática, ainda é possível encontrar lugares nos quais ouvir, dançar, pular ou fazer o que lhe der na veneta ao som de rock: a festa Se a moda pega, promovida pela banda Canastra no bar (casa de show, restaurante ou sei lá o quê) Estrela da Lapa (Mem de Sá, 69) já está em seu segundo ano. De acordo com o
Jornal do Brasil a festa é regada a rockabilly, dixieland, surf music e jovem guarda e rola toda quinta. (Curioso como os desde os Raimundos, pelo que vejo, os roqueiros ressuscitaram a jovem guarda, que foi visto desde a época do programa de TV como coisa de alienados e cópia mal feita de música de gringo).
A questão de casas adequadas para o rock acho que pode dar o que falar, mas passei na
Banca do Blues (esquina de av. Rio Branco com Pres. Wilson) e perguntei sobre os shows que aconteciam ali. O Paulo, dono do estabelecimento, produziu diversos shows, ali mesmo na esquina, que foram um sucesso (eu mesmo fui a alguns). Como ele mesmo diz: “era show mesmo, não era rodinha de violão, não”. O espaço era aberto aos novos talentos, mas não deixava de ter gente consagrada (exemplos são Big Gilson, Claudio Bedran e Pedro Strasser, todos do Bleus Etílicos; Jefferson Gonçalves, do extinto Baseado em Blues; e Big Joe Manfra), e ainda por cima esses músicos se apresentavam de graça. O show era do jeito que o carioca gosta: de graça e em espaço aberto. Conversa vai, conversa vem e ele me disse que o subprefeito do Centro revogou a autorização para a realização do evento no começo do ano passado. Segundo a Subprefeitura, os motivos da suspensão da autorização foram “Aglomeração de pessoas na esquina, que causaria transtornos aos pedestres. A falta de banheiros químicos. Venda de bebidas alcoólicas na banca”. Engraçado, como pode um evento que começa sexta-feira às 21h, no centro da cidade, atrapalhar os pedestres. Segundo o Paulo, o problema foi mesmo com os vizinhos, nada de pancadaria, bate-boca ou coisa do tipo, mas tinha gente que não gostava daquela bagunça organizada. Sem problemas, o cara parou, pensou, e o negócio é o seguinte: o evento vai voltar com o mesmo nome,
Banca do Blues, mas será na
Vintage Music, loja de instrumentos musicais (rua Visc. do Rio Branco, 37, esq com Gomes Freire), ou seja Lapa. O primeiro show vai ser dia 16/01/10. Será que existe um local mais adequado para um show de música do que uma loja que vive de música? (Vide Modern Sound.) O engraçado do assunto é que o Paulo diz que o negócio é dedicado ao blues, quando cheguei lá ele tava vendo um DVD do Steve Ray Vaughan tocando
Love Struck Babe, que na minha modesta opinião é um rock do caralho.
Já a questão de política pública voltada para o rock... acho que isso não rola, não. Só se os roqueiros do Rio se unirem. Quando digo roqueiro, digo os amantes do gênero, músicos e organizadores de eventos. Mesmo assim, vai ser bem difícil... só espero morder minha língua sobre a questão.